terça-feira, 6 de maio de 2014

O negócio é facilitar...


Ontem, li um artigo da Folha de S. Paulo sobre um projeto da escritora Patrícia Secco, que tem como objetivo reescrever alguns clássicos da literatura. Algo nada inovador se levarmos em conta que existem por aí milhares de adaptações e resumos. Porém, foi com um quê de tristeza que cheguei à conclusão de que o grande problema da falta de leitura no Brasil, problema esse que aprisiona nossos jovens há anos, continua a ser tratado com o famoso jeitinho.
A escritora alega que algumas obras da literatura brasileira, como O Alienista, de Machado de Assis, por possuírem muitas palavras desconhecidas precisam ser simplificadas. A proposta dela é trocar essas palavras "difíceis" por outras mais "fáceis". Ela diz também que a modificação que fará no texto de Machado não mudará em nada o estilo do escritor, que a ideia é apenas tornar a leitura mais  acessível aos jovens leitores.

Para mim o projeto da escritora Patrícia Secco equivale a empurrar a sujeira para debaixo do tapete. S
abemos, infelizmente, que nossos jovens não leem quase nada. Não leem porque não foram habituados a isso. E eu acredito que o que deve ser feito, antes de mais nada, é estimular o gosto pela leitura desde a mais tenra idade, oferecendo textos mais simples para que o leitor se acostume a ler de forma natural, sem achar que é um fardo. Para isso há muito material disponível, pois vários escritores têm obras voltadas para o público infantil. Monteiro Lobato é um deles.
A criança pode iniciar sua caminhada no mundo da literatura por meio dessas obras, pelo menos até tomar o gosto pela leitura. Esse gosto pode ser estimulado pelos próprios pais, em casa mesmo: um gibi, um livro do Sítio do Picapau Amarelo, enfim, há infinitas possibilidades. Então, quando a criança finalmente chegar à adolescência, já terá maturidade literária suficiente para ler e entender "O Alienista", por exemplo. Ela pode, inclusive, usar um dicionário como apoio. Por que não? É muito melhor instruir que adaptar a obra  à falta de conhecimento do leitor.

Ora, se a leitura serve também para aumentar nosso vocabulário, não vejo sentido algum em substituir a palavra "sagacidade" por "esperteza", como fez a escritora. O trabalho de Patrícia Secco, que chegará ao leitor em junho, no lugar de ajudá-lo a pensar e expandir seus horizontes, faz o caminho inverso. O leitor é levado a não usar a própria cabeça, acostumando-se a receber o conteúdo mastigado.

Finalmente, eu não vejo esse projeto como um incentivo à leitura, mas como uma forma de mascarar algo que é visível a olho nu: nossos jovens não estão habituados a ler. Lástima.

E vocês, o que pensam sobre esse assunto?

6 comentários:

  1. Eu não li este artigo da folha, mas concordo totalmente com você: sou contra também!
    Nossa, me lembrei agora da minha época de escola. Quando não soubéssemos as palavras, eramos estimulados a procurar no dicionário e eu adorava descobrir palavras novas!
    Cada vez mais vejo o empobrecimento do voculário entre os jovens. Se os pais não fizerem nada (não só os professores), vejo um futuro de analfabetos funcionais. Abs

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    1. Oi, Sandra!
      Na minha época também era muito comum utilizar o dicionário para procurar palavras desconhecidas do próprio livro didático. Mas, te digo, eu não lembro nunca de ter lido livros em sala de aula. Leitura, dessa forma, nunca fez parte do currículo na minha escola. Eu fiz todo o ensino fundamental em escola pública, e por mais que puxe da memória, não consigo lembrar uma só vez que a professora indicou, recomendou ou trabalhou um livrinho de literatura em classe. As poucas coisas que li nessa época, li por minha conta, estimulada por minhas irmãs mais velhas que já pegavam alguns livros em biblioteca. Por isso te digo, essa carência de leitura, de falta de estímulo já vem de muito tempo... Acredito que nem todas as escolas são assim, mas infelizmente eu não tive muita sorte nesse sentido.
      Beijos

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  2. Alio-me a tua opinião,Day.Vejo tal iniciativa como desmerecimento da capacidade dos leitores, sejam eles de qualquer faixa etária.O saudável exercício de decodificação e elaboração dos significados estimula, para dizer o mínimo, o enriquecimento de vocabulário e o avanço nas estruturas da língua.
    Esta pretensa facilitadora está na verdade, empobrecendo a experiência de leitura e profanando a criação do Machado de Assis. Um atraso anunciado.
    Abraço,
    Calu

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    1. Calu, é por aí mesmo! Ao facilitar demais a escritora acaba prejudicando a experiência de leitura do aluno. Além disso, acho que Machado não é um escritor pra criança muito jovem... Tudo ao seu tempo!
      Beijo

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  3. Exatamente, Day!
    O ensino da literatura brasileira poderá começar, como foi no meu tempo, por Monteiro Lobato e aos poucos introduzir Machado de Assis.
    Só digo uma coisa: Machadinho deve estar triste vendo isso lá de cima. rsss
    um grande abraço carioca


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    1. Oi,Beth!
      Eu li muito Monteiro Lobato quando era menina, mas por minha própria conta, apesar de minha escola não ter trabalhado muito essa parte, fui estimulada dentro de casa. Guardo até hoje 'Reinações de Narizinho' e fiz questão de apresentar Monteiro Lobato pra meus dois filhos.
      Beijos :D

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